A SOCIEDADE, O ÓDIO E JESUS
Não pensem que eu vim trazer paz à terra; não vim trazer paz, mas espada (Mateus 10.34).
Recentemente li um artigo da escritora Ruth Manus em sua coluna no Estadão sobre a cultura do ódio, onde ela diz: "Estamos vivendo um momento que nos assusta exatamente porque um imenso número de pessoas passou a ter orgulho do próprio ódio, bem como a cultivá-lo ao invés de buscar ferramentas para combatê-lo. Chegamos ao absurdo de ver gente batendo no peito, dizendo que cometer um crime de ódio não é uma ideia que esteja fora de questão. Tem cada vez mais gente vangloriando a violência e a ignorância e nós precisamos conversar sobre isso".¹
Concordo com a Ruth Manus sobre a importância de falarmos sobre o tema do ódio, mas confesso que tenho a sensação de que nem todos estão abertos a conversar sobre o assunto. Alguns por causa do orgulho, outros por medo de ceder ou reconhecer uma necessidade de mudança e sobretudo por ter que aceitar aqueles que são diferentes em sua forma de pensar e de agir. Esse não é um fenômeno atual, a cultura do ódio é algo que vem lá do passado e que tem se perpetuado ao longo dos séculos até os nossos dias. Na Bíblia é possível observar muitas situações onde o ódio e suas consequências ficam evidentes. Porém é nos Evangelhos, nos registros da vida de Jesus, sua interação com a sociedade e a reação dela aos seus ensinos e modo de vida que podemos observar com clareza a verdadeira face do ódio. O Senhor Jesus passou a ser vítima do ódio ainda bebe, quando seus pais precisaram fugir com Ele para o Egito a fim de preservar sua vida (Mateus 2.13). Naqueles dias havia um forte boato sobre o nascimento do Messias, algo que se confirmou com a presença dos magos na Judeia e sua visita a Herodes (Mateus 2. 7,8). Por medo de perder o trono no futuro, Herodes deu início a uma verdadeira chacina de bebês inocentes, por se sentir ameaçado por eles. Milhares de vidas foram ceifadas por causa do ódio e amor ao poder. A Bíblia não dá detalhes da adolescência de Jesus, mas ela descortina e revela muitas situações de preconceito, de intolerância e de ódio enfrentadas por Jesus em sua vida adulta. No início de Seu ministério quando ainda estava recrutando seus discípulos, Ele e parte de seus discípulos foram questionados pelos escribas e fariseus, por se relacionarem com publicanos e pecadores (Marcos 2. 13-17). Para os fariseus todos aqueles que não eram adeptos de sua seita, eram pecadores e portanto indignos de respeito e aceitação. Jesus quebra esse paradigma preconceituoso ao sentar à mesa com os publicanos e "pecadores" e se relacionar com eles como iguais. Algo que para os fariseus era um ato de rebaixamento moral e uma grande humilhação social. Em outra ocasião, Jesus foi tocado por uma mulher que sofria de um incontrolável fluxo menstrual, doença que era considerada na época um castigo de Deus. E que tornava a mulher portadora da doença impura e portanto excluída da sociedade (Lucas 8. 43-48). Além de comunicar a todos que havia sido tocado por ela, Jesus desenvolveu um diálogo com a mulher exaltando sua fé. Feito inusitado e provavelmente inédito na sociedade judaica do primeiro século, que acreditava no método da exclusão social como o único meio de lidar com esse tipo de doença. Em outro momento Jesus retorna com seus discípulos, para Nazaré a fim de compartilhar seus ensinamentos. Porém com o propósito de destruir a imagem de Jesus, desacreditá-lo e incitar o ódio contra Ele, os fariseus o acusaram de fazer milagres pelo poder de Belzebu, o maioral dos demônios. E seus familiares persuadidos pelos fariseus acusaram Jesus de "estar fora de si" (Marcos 3. 20-30). E na mesma cidade de Nazaré, após pregar na sinagoga e expor sua interpretação das Escrituras, Jesus foi expulso da cidade e desapareceu na multidão para não ser morto pelos fariseus (Lucas 4. 29-30). É possível perceber nos Evangelhos, que à medida que o tempo vai se passando e o ministério de Cristo vai se desenvolvendo, as hostilidades também vão aumentando e o ódio contra Ele vai crescendo. Isso revela algo importante sobre a cultura do ódio. Esse fenômeno comportamental se fundamenta na dificuldade de aceitar aquilo que se destaca na sociedade e que é diferente de mim. Diferente do grupo ao qual pertenço. Diferente do modo como penso e dos valores que cultivo. E essa diferença gera medo e insegurança em relação ao novo e ao futuro. E diante daquilo que me gera medo ou que aparentemente se apresenta como uma ameaça ao meu "status quo", reajo com ódio e violência para proteger o que é meu. Um comportamento que apesar de ser bastante primitivo é extremamente atual. Segundo os neurocientistas o ódio é ativado nas áreas mais primitivas do cérebro, responsáveis pelo sistema de recompensa cerebral. Áreas ativadas quando tenho fome ou sede saciadas. Ou quando me apaixono instantaneamente por alguém que mal conheço. Ou seja, áreas do cérebro que apenas respondem aos estímulos externos automaticamente, sem a necessidade de pensar.²
Portanto, aqueles que pensam não se entregam ao ódio, mas buscam uma forma melhor para lidar com as diferenças. E essa realidade podemos ver de forma clara na vida de Jesus. Que sempre respondeu ao ódio com sabedoria e amor:
"Vocês ouviram o que foi dito: ame o seu próximo e odeie o seu inimigo. Eu porém lhes digo: amem os seus inimigos e orem pelos que perseguem vocês, para demonstrarem que são filhos do Pai de vocês, que está nos céus (Mateus 5. 43-45).
O Senhor Jesus vai além ao ensinar a lidar, não apenas com as diferenças, mas a lidar com aqueles que nos odeiam. Com respeito, empatia e amor! Quando Jesus foi cercado no jardim do Getsêmani por soldados armados e ferozes, o discípulo Pedro saiu em sua defesa cortando a orelha de um dos soldados. Imediatamente, Jesus restaurou a orelha do soldado e se entregou de forma pacífica aqueles que estavam obstinados a tirar-lhe a vida (João 22. 50-51). Mesmo diante de uma grande injustiça, vítima de uma covarde traição e consciente de sua morte iminente, Jesus demonstrou total lucidez em meio dor, empatia e amor para com seus inimigos. O ódio não é o único caminho. Nem mesmo em meio a situações extremas. Existe outro caminho para lidar com as diferenças, a intolerância e o ódio alheio. Esse caminho é Jesus (João 14.6). Diante dessa afirmação é possível que surjam alguns questionamentos. "Se Jesus é o caminho para a tolerância e o amor, porque Ele disse:"
Não pensem que eu vim trazer paz à terra; não vim trazer paz, mas espada (Mateus 10.34).
Muitos acreditam que nesse texto Jesus está incentivando a intolerância e o ódio entre as pessoas. Porém, nesse texto o Mestre Jesus está falando sobre as diferenças de valores e a incapacidade humana de lidar com essas diferenças. "Então porque que existe tanto preconceito e intolerancia no meio cristão? Se Jesus é o caminho porque há tantos registros de crimes de ódio praticados por pessoas ditas cristãs? Se Jesus é o caminho porque vejo e ouço tanto ódio nos discursos e atitudes dos líderes critãos"?
Porque esses professos cristãos ainda estão no caminho. Eles ainda não chegaram até Jesus! O caminho da vida cristã é um longo trajeto de aprendizado, de altos e baixos, muitos se perdem no meio do caminho e outros levam tempo para chegar próximo de Jesus. Mas aqueles que o encontram de forma pessoal, tem a sua vida transformada por Ele (2 Coríntios 5.17). E passam a agir de forma consciente em favor do amor. Após a prisão, Jesus foi levado a julgamento do Sinédrio. Ali Ele enfrentou em silêncio, todas as zombarias, as falsas acusações, as cusparadas, bofetadas e a sentença de morte (Mateus 26. 57-68). Sentença que foi confirmada logo depois por uma grande multidão que incitada pelos fariseus clamaram: "Que seja crucificado" (Mateus 27. 20-23). A Cruz foi o ápice de todo o ódio por parte dos fariseus e da sociedade que os apoiaram. Mas a Cruz também foi o ápice do amor de Deus pela humanidade. Em meio a toda angústia, dor e sofrimento o Senhor Jesus olhando para os seus inimigos disse:
"Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem" (Lucas 23.34).
Todos aqueles que são movidos pelo ódio, agem de forma carnal, primitiva e irracional (Gálatas 5. 19-21). Mas aqueles que agem movidos pelo amor, o fazem por intermédio da ação do Espírito Santo em suas vidas (Gálatas 5. 22-24). E agem pelo poder de Cristo! Que diz para mim e para você:
"...Pois sem mim nada podeis fazer" (João 15.5).
Que Deus lhe abençõe em sua caminhada cristã, lhe proteja e lhe dê a vitória sobre a natureza pecaminosa que insiste em nos conduzir em direção ao ódio.
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