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terça-feira, 14 de maio de 2019

A ESPOSA DO PASTOR E A SOLIDÃO MINISTERIAL


Normalmente se reconhece que o pastor é uma pessoa solitária. As inúmeras atividades da igreja local dificultam o cultivo de amizades próximas com outros ministros que também se encontram focalizados em seus afazeres. Também, no geral, quando suas ovelhas se aproximam dele é com o propósito de apresentar alguma necessidade, dilema ou assunto a ser decidido. O pastor, na maior parte do tempo, se vê como um “resolvedor de problemas” e nem sempre tem alguém para compartilhar sua própria dor ou dilemas. Tudo isso contribui para que ele se sinta solitário.


Todavia, poucos atentam para o fato de que ao lado do pastor existe alguém mais solitário do que ele: a sua esposa! O próprio fato de ela ser identificada apenas como a “esposa do pastor” demonstra que alguns nem se lembram do seu nome e, provavelmente, desconhecem sua história, sua habilidades, temores e sonhos. Além do mais, se o pastor é procurado para ajudar pessoas com os seus problemas, sua esposa, na maioria das vezes, nem para isso é procurada. De fato, a esposa do pastor provavelmente é a ovelha mais solitária no rebanho.


Talvez essa seja uma das razões porque o ministério da esposa do pastor tem sido definido como “o trabalho mais difícil do planeta”.[1] O irônico é que quando se ingressaram nesse ministério, algumas não tinham a mínima noção das dificuldades envolvidas. Muitas pensaram que estavam apenas realizando o sonho do casamento. Todavia, além do casamento, também estavam se alistando para uma vida repleta de fatores que contribuiriam para sua solidão. Esse é um assunto que não é muito discutido ou divulgado. Afinal, a esposa ainda fica temerosa de atrapalhar o ministério do marido se as pessoas tomarem conhecimento disso e outras até se culpam por se sentirem assim. Se o marido está fazendo a “obra do Senhor”, por que elas deveriam deixar que isso se torne um empecilho?


Pouca atenção havia sido dada a esse fenômeno até que, mais recentemente, Thom Rainer, pesquisador batista, passou a arquivar e organizar por temas, testemunhos de algumas esposas de pastores[2]. Além de serem solidárias com as pesquisas, as esposas de pastores foram muito transparentes quanto ao que contribuía para seu sentimento de solidão no ministério. Embora a pesquisa originalmente tenha sido conduzida no contexto americano, os resultados são elucidativos para a realidade brasileira. Dessa maneira, passo a ressaltar dez razões mais comuns, das doze apresentadas por Rainer, que mais refletem a realidade brasileira e explicam algumas causas da solidão das esposas dos pastores. Para tanto, serão utilizadas as frases de algumas das entrevistadas, pois elas parecem ser representativas da maioria.


Relações superficiais na igreja. “Ninguém nunca me vê como minha própria pessoa. Eu sou apenas a esposa do pastor. Talvez por isso, ninguém tenta se aproximar de mim”.


Um pastor/marido extremamente ocupado. “Meu marido está sempre ligado 24 horas por dia. Ele não tem tempo nem para tomar o café-da-manhã comigo. Geralmente só recebo as sobras do que ele gasta com a igreja”.


Membros maldosos na igreja. “Acho que até me isolei um pouco, pois não quero continuar ouvindo as coisas horríveis que dizem sobre meu marido. Eu conheço a dedicação dele, mas algumas pessoas, por não gostarem do estilo do trabalho dele, acabam me usando para ofendê-lo”.


Serem usadas como um canal para reclamações para chamar a atenção do pastor. “Na semana passada, alguém me disse que sua família estava deixando a igreja porque meu marido é um péssimo pregador. Outra família me disse que o pastor anterior é que sabia, de fato, pastorear. Essas pessoas parecem não ter a mínima ideia de como isso me faz sentir!”


Confiança quebrada. “Eu desisti de tentar me aproximar dos membros da igreja. Eu pensei que tinha uma amiga próxima até descobrir que ela estava compartilhando tudo o que eu dizia com outras pessoas da igreja. Isso me inibiu emocionalmente”.


Mudanças frequentes. “Tenho medo de me aproximar de alguém agora. Toda vez que desenvolvo um relacionamento mais profundo com alguém, nossa família muda para outro campo”.


Nenhuma noite a sós com o marido. “Não me lembro da última vez em que meu marido e eu tivemos uma noite juntos. Há programação na igreja todas as noites e se ele está ausente, as reclamações no domingo são insuportáveis”.


Comentários negativos sobre os filhos. “Eu realmente não tento mais me aproximar dos membros da igreja. Estou cansada de como eles dizem que eu devo criar meus filhos. Parece que todos têm filhos perfeitos, menos eu. Todavia, eu sei como o meu marido tenta ajudar alguns deles porque não sabem mais o que fazer com seus filhos”.


O marido não dá prioridade à esposa.“Francamente, a igreja parece ser a amante do meu marido. Eu me sinto trocada por outra pessoa; nesse caso, por muitas outras pessoas. Acho até irônico que ele diga que a igreja é a ‘noiva do Cordeiro’, pois nesse caso, ele parece em adultério com aquela que também pertence a outro”.


Dificuldades financeiras. “Meu marido ganha muito menos dinheiro do que a maioria dos membros da igreja. Eu simplesmente não posso me dar ao luxo de ter a vida social que eles têm. Nem roupa para isso eu possuo. Assim, melhor me afastar”.


É importante que se deixe claro que as esposas de pastores não olham apenas para o “lado negro” do ministério pastoral. Elas geralmente reconhecem as bênçãos e alegrias no desempenho do seu papel ao lado do esposo. Todavia, não se pode ignorar que algumas delas sofrem com solidão severa. Os testemunhos registrados acima descortinam uma realidade ignorada por muitos membros da igreja. Isso deveria motivar os cristãos a intercederem mais pela esposa do seu pastor, bem como a tratá-la com maior amabilidade e amor cristão. Também, deveria levar o marido pastor a expressar melhor cuidado pela sua esposa e organizar sua agenda de tal maneira que ela seja parte importante do seu dia-a-dia. Afinal, a exortação do apóstolo Paulo permanece: “Quem ama a esposa a si mesmo se ama” (Ef 5.28).

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